segunda-feira, 30 de setembro de 2013

Haddad avalia primeiros nove meses de gestão e mostra mudanças na política municipal


Haddad avalia primeiros nove meses de gestão e mostra mudanças na política municipal

Em entrevista ao programa Discuta São Paulo, Fernando Haddad (PT) falou de como tem enfrentado os principais problemas da cidade que governa: moradia, dívida pública, educação, plano diretor, meio ambiente e a descentralização. Além disso, quando perguntado sobre seu futuro político, disse considerar “um erro muito grave o político que imagina que São Paulo possa ser trampolim de alguma coisa”

O prefeito Fernando Haddad, de São Paulo, participou de um debate-entrevista nesse sábado, 28, com jornalistas da rádio CBN de São Paulo, no Conjunto Nacional, na avenida Paulista. Na Livraria Cultura, Fernando Haddad conversou com Fabíola Cidral, Gilberto Dimenstein, Fernando Abrucio, especialista em administração pública, e Horácio Figueira, engenheiro especialista em mobilidade urbana, em frente a uma plateia, como parte do programa Discuta São Paulo. 

A âncora do evento, Fabíola Cidral, começou o debate anunciando que passaria a Haddad a pergunta mais recebida de todos os tempos no programa, a sempre capciosa questão envolvendo o fato de o prefeito defender ardorosamente o transporte público e não usar o transporte público. Haddad respondeu que tem negociado com a segurança da prefeitura para voltar a utilizar, já que sempre utilizou, bem como seus filhos e sua mãe. Haddad ainda contou que sua mãe tem elogiado o transporte público. 

O prefeito explicou que da prefeitura para a casa dele, é muito mais fácil ir de ônibus do que de carro, mas que há todo um empecilho no que diz respeito à segurança, ainda que aos fins de semana ele consiga “driblar” e passear pela cidade. Haddad então, ao ser confrontado com o exemplo dos políticos da Inglaterra, que têm inclusive vale-transporte, mencionou seu chefe de segurança, pressionando-o. Ele ainda disse que discute a questão com seus secretários e rechaçou a ideia da criação de uma linha especial para ele e para o secretariado, dizendo que “quanto mais próximo nossa vida do cotidiano, melhor”, e que queria usar os mesmos meios que todos os paulistanos. 

Como era de se esperar, ainda mais depois das grandes manifestações de junho, a questão do transporte urbano foi das mais abordadas. E a pergunta que surge é “como abandonar o carro se ainda não há oferta de transporte público suficiente?” “Apesar de 90% da população aprovar as faixas exclusivas, há muitas críticas ao transporte em São Paulo”, disse Fabíola Cidral, enquanto Horácio Figueira disse que se o prefeito passasse a usar transporte público, seria “o maior marketing para o transporte”, algo digno de se aplaudir de pé. Ele então abordou a questão dos pedestres, que têm pouca segurança, por conta, principalmente da pouca fiscalização da CET, além de grandes tempos de espera nos semáforos de pedestre. 

Haddad contou que mora no Paraíso “que é um bairro que está envelhecendo”. Por isso, disse ele, a principal reivindicação das pessoas que o abordam no bairro diz respeito a isso mesmo, à questão do pedestre. Segundo o prefeito, os esforços para melhorar os ônibus nos últimos três meses foram “sobrehumanos”, mas ele já colocou “no radar do [Jilmar] Tatto [secretário de Transportes] a questão do pedestre, que vamos ter que cuidar em breve também”. 

O prefeito falou também que cerca de 4.800 cruzamentos, de um total de seis mil, serão reformados. Segundo ele, há quarenta anos não se faz reformas nos cruzamentos, “e eu pedi que se fizesse a reforma pensando na questão do pedestre”. 

Descentralização
Fernando Abrucio emendou o tema da mobilidade na questão de descentralização da cidade. “Grande parte do problema da mobilidade na cidade tem a ver com a concentração da cidade em poucos lugares”, disse o especialista da FGV. Mas a pergunta dele trouxe uma percepção de que subprefeituras estão sucateadas, e o que a Prefeitura estaria fazendo para mudar isso.

Fernando Haddad contou que nos últimos anos a perspectiva da Prefeitura vinha sendo de “re-centralizar todas as atividades da prefeitura”, diferente de dez anos atrás (quando Marta Suplicy era prefeita da cidade). 

O prefeito explicou que é difícil descentralizar e usou o exemplo da varrição. Chegou a corrigir a âncora Fabíola Cidral, que disse que o contrato de varrição era de R$ 1,8 bilhão: “Isso é com a coleta. Só a varrição é em torno de metade desse valor”, disse o prefeito. Ele então explicou que não é necessariamente melhor descentralizar por meio das subprefeituras, pois isso tende a gerar uma “perda de escala, o que pode comprometer os custos”. Mas ressaltou que uma das mudanças nas subprefeituras foi a desmilitarização, nomeando servidores de carreira, além da criação da controladoria geral do município. 

Poluição
Outro assunto abordado foi a questão da poluição, que mata mais que o trânsito em São Paulo, e as implicações nas mudanças no sistema de inspeção veicular em São Paulo, que será menos rigoroso com carros mais novos. Segundo o prefeito, “a aprovação dos carros novos é de quase 100%”. Ou seja, as mudanças vêm no sentido de racionalizar a inspeção.

Perguntado se pretende mudar as regras da inspeção para o ano que vem, Haddad disse que vai “cumprir a lei aprovada na Câmara e que foi promessa de campanha, que é a isenção da taxa e a mudança na periodicidade da inspeção”. Frente a um estudo da USP de que as mudanças aumentarão as mortes por conta de um eventual aumento da poluição, Haddad foi rigoroso: “Discordo do estudo”. E explicou que conhece o estudo e discorda da metodologia: “Ao invés de colocar pressão na prefeitura de uma cidade sem dinheiro, deveria fazer um estudo mais amplo, vendo como funciona a inspeção no mundo todo”.

“Eu acredito que a poluição mata, mas em nenhum lugar do mundo se faz inspeção de carros novos”, disse o prefeito. Porém, segundo ele, se um carro novo polui mais do que devia, a culpa é da fábrica, e a prefeitura não pode gastar dinheiro público para resolver um problema que deveria ser resolvido pela empresa multinacional.

Além disso, Haddad citou outro problema, o dos motoristas que licenciam seus carros em outras cidades para fugir da inspeção. “São Paulo perde o IPVA e fica com a fumaça”, disse. Segundo o prefeito, tudo começou com um contrato errado, que já foi condenado pela justiça. “É um contrato que começou errado e vai terminar”.

Haddad demonstra conhecimento sobre a cidade

Perguntado por um membro da plateia sobre saúde, em especial no caso do extremo da Zona Leste, Haddad demonstrou saber qual era a demanda específica da comunidade do local. Segundo ele, a mudança do local da Unidade Básica de Saúde do local já foi incluída no cronograma da Secretaria de Planejamento. “Fui lá há cerca de um mês, conheci essa UBS e de fato ela está num local muito precário, e alugado”, disse o prefeito. 

Outro participante perguntou sobre e defendeu o pedágio urbano. Porém, o prefeito afirmou que defende “uma alternativa até mais eficaz”: a municipalização da Cide, imposto que incide sobre os combustíveis que e atualmente é federal. Dessa forma, disse Haddad, teríamos o “subsídio cruzado, o imposto sobre a gasolina financiando a tarifa de ônibus”. Ao ser questionado sobre se poderia restringir a entrada de carros na região central, Haddad explicou que “a ideia é ampliar tanto quanto for possível o espaço para o transporte público”. 

Outro “ponto polêmico” foi a da permissão aos taxistas de circular nas faixas exclusivas de ônibus, quando com passageiros, como já ocorria antes das faixas novas. O próprio Horácio Figueira pediu permissão do prefeito para responder que, na verdade, táxi também é transporte individual, como os outros carros, apesar de ser público. O prefeito explicou que os táxis diminuem a velocidade dos ônibus de fato, e que essa é uma decisão técnica, mas ainda em estudo.

Emendando na questão dos táxis, o prefeito foi perguntado sobre os alvarás. Segundo Haddad, se for para se vender alvará, “isso deve ser revertido em benefício da cidade, e não do particular”. O prefeito explicou que a prefeitura está recorrendo da decisão judicial, de acabar com os alvarás e se fazer uma nova licitação pública, dizendo que “quem tem alvará deve continuar na praça”, e que essa medida deveria valer daqui para frente.

Em seguida, o assunto que surgiu é dos mais delicados no que diz respeito à gestão da cidade de São Paulo: a questão da dívida. A pergunta não poderia ser outra: o que São Paulo pode fazer com a situação caótica atual e ainda continuar investindo na cidade?
Haddad explicou que a dimensão da dívida e a eficiência da máquina pública não se compensam. O prefeito contou que determinou, em fevereiro, um corte de 20% nos contratos, o que gerou uma economia de R$ 500 milhões, “sem os quais não se chegaria no final do ano”. Porém, no mesmo ano, a dívida aumentou em R$ 5 bilhões, por um contrato equivocado assinado ainda na gestão de Celso Pitta. Por conta desse descompasso dos indexadores, “a União enriqueceu às custas do município”, agravando a dívida ao invés de aliviá-la. 

Moradia
A jornalista Fabíola Cidral lembrou que tem havido muitas manifestações reivindicando moradias, que é um grave problema na cidade. Fernando Haddad explicou que a meta é contratar 55 mil moradias até o final do governo, das quais 37 mil já foram mapeadas e contratadas. 

Foi então lembrado dos terrenos e construções abandonados em São Paulo, que poderiam virar habitação para muita gente. Haddad defendeu então o programa federal Minha Casa Minha Vida, dizendo que o grande erro da prefeitura foi não ter aderido antes ao programa. “Nosso grande problema foi tentar equacionar o problema sem apoio federal”, apontou Haddad. Sobre os prédios abandonados, o prefeito explicou que grande parte deles é do INSS, e que a Prefeitura está atualmente requisitando ao INSS que pague a dívida que tem com o município “em propriedade”. Há, inclusive, boa parte desses prédios sendo ocupados pelos movimentos de defesa de moradia hoje em dia. 

Além disso, o prefeito tratou da questão dos moradores de rua, dizendo que a gestão atual corrigiu um problema que foi tratar os usuários de drogas como caso de polícia, o que, segundo ele, “disseminou a cracolândia para a cidade inteira”, e passou a tratar a cracolândia como um problema “assistencial”. Ele disse ter boas perspectivas com a nova parceria com o programa do governo federal Crack, É Possível Vencer.

Educação

O prefeito então foi perguntado sobre os programas da prefeitura para a educação, tendo em vista que grande parte da população demanda escola em tempo integral. Porém, não se pode simplesmente estender o atual modelo educacional, fazendo-o durar o dia inteiro.

Haddad citou o programa Mais Educação, ainda de quando ele estava à frente do Ministério da Educação, que amplia a permanência da criança na escola, “mas ampliando seus horizontes cognitivos e culturais”. “É um programa que abre um segundo turno diferente do primeiro”, explicou. 

Perguntado sobre o programa educacional para a cidade, ele disse que não se trata de algo “revolucionário”, pois não se pode mudar do dia para a noite. Ele explicou que os CEUs estão sendo transformados em polos universitários, com cursos de pós-graduação lato sensu. 

Meio ambiente
Fernando Haddad afirmou que sua administração foi a que mais fez pelo meio ambiente, usando as faixas de ônibus como exemplo. Além disso, ele contou que ainda esse ano São Paulo terá sua capacidade de reciclagem dobrada. 

Plano diretor
Entre as perguntas dos ouvintes, diversas falavam do plano diretor, inclusive falando sobre a influência da especulação imobiliária nos rumos da cidade. Haddad lembrou como em 2002 o setor imobiliário, segundo ele, “ganhou o debate” e a outorga onerosa – o que as empreendedoras precisam pagar a mais quando querem construir mais do que o coeficiente permitido em lei – foi muito baixa, o que ocasionou pouca arrecadação. E fez um alerta: “esse ano podemos perder de novo”. 

Questionado sobre a pressão que a Prefeitura recebe do setor imobiliário, Haddad chamou a responsabilidade para o que ele chamou de “uma sociedade bem mais amadurecida” e disse que “vindo aqui [no debate da CBN], estou contribuindo com a cidade pois estou dizendo que está em jogo os próximos 20 ou 30 anos de São Paulo. Essa lei [o plano diretor] vai definir o futuro pelos próximos 20 ou 30 anos”, afirmou, pedindo mobilização da sociedade.

Em relação aos bairros em que “não cabe mais prédio”, Haddad disse que a Prefeitura está “desadensando, diminuindo o potencial de aproveitamento dos terrenos”, citando Moema, Pinheiros, Perdizes e Paraíso. Isso acontecerá, segundo o prefeito, “independente de pagamento de outorga, porque não nos interessa arrecadas com isso onde não cabe mais prédio”.

Haddad explicou então que o plano diretor “estimula a verticalização e o adensamento onde há transporte público”. 

Sobre o fato de o Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica) de São Paulo ser “muito ruim”, Haddad disse que o absenteísmo é muito alto e que é preciso dar melhores condições de trabalho para os professores. Além disso, é preciso fazer acompanhamento, especialmente com as escolas com Ideb mais baixo.

Futuro político

Já perto do fim do programa, o prefeito foi perguntado se assumiria, numa futura campanha pela reeleição, novamente, um compromisso de não sair candidato e terminar seu (eventual segundo) mandato de prefeito. Haddad contou que se sente, desde sempre, professor da USP, e que considera “um erro muito grave o político que imagina que São Paulo possa ser trampolim de alguma coisa” pois, como o prefeito explicou, administrar São Paulo é um desafio enorme, pelas graves deficiências estruturais que a cidade tem.

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