quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

Com disputas fronteiriças e dirigentes nacionalistas, Ásia se prepara para a guerra fria



Com a vitória da conservadora Park Geun-hye nas eleições presidenciais da última quarta-feira (19) na Coreia do Sul, se encerra um ano em que os três países do nordeste da Ásia - China, Japão e Coreia do Sul - mudam de liderança em um momento crucial de suas relações e quando tudo aponta para o início de uma nova guerra fria no continente. O apogeu do nacionalismo nos três países e nas ilhotas em disputa entre a China e o Japão, umas; e entre Japão e Coreia, outras; somado à mudança na estratégia de defesa dos EUA faz temer um agravamento das tensões na região e um avanço da já iniciada corrida armamentista, sobre a qual paira a ameaça nuclear da Coreia do Norte.

Georgina Higueras
Avião da Administração Oceânica chinesea voa pelas ilhas Senkaku/Diaoyu
Avião da Administração Oceânica chinesea voa pelas ilhas Senkaku/Diaoyu
Xi Jinping, eleito secretário-geral do PCCh (Partido Comunista Chinês) em novembro passado, pediu a suas forças armadas que "intensifiquem sua capacidade para o combate real" durante a primeira reunião que teve com os altos comandos do Exército Popular de Libertação como líder máximo comunista. Xi se referiu aos novos desafios que enfrenta o exército mais numeroso do mundo, com 2,3 milhões de efetivos, "na era da informação" e o incitou a "melhorar a habilidade de lutar em guerras regionais".
As palavras de Xi, que será nomeado presidente da República Popular em março próximo, não tranquilizaram seus vizinhos. O orçamento militar da China há quase uma década cresce dois dígitos por ano. Em 2012 chegou a 80,423 bilhões de euros, o que representa um aumento de 11,2% com relação ao ano passado. Este ano também lançou seu primeiro porta-aviões e melhorou consideravelmente as capacidades de sua marinha, o que é visto com extrema preocupação pelo Japão e os países do Sudeste Asiático com os quais disputa outras ilhotas no mar do Sul da China.
A ascensão no Japão de Shinzo Abe, falcão do PLD (Partido Liberal Democrata), tampouco suaviza as tensões. Em seu primeiro discurso depois de sua vitória arrasadora nas eleições legislativas de domingo passado, Abe deixou claro que as ilhas Senkaku (em japonês) e Diaoyu (em chinês) "fazem parte integral do território do Japão" e rejeitou qualquer tipo de negociação a respeito. Com isso, Abe deixou claro para Pequim desde o início de seu mandato quais são suas linhas vermelhas, embora posteriormente tenha lhe estendido um ramo de oliveira ao salientar que a China é "o primeiro parceiro comercial do Japão".
Abe aprova que o Japão transforme suas forças de autodefesa em um exército regular, o que exige reformar o artigo 9º da Constituição pacifista imposta em 1946 pelos EUA como potência ocupante depois da derrota japonesa na Segunda Guerra Mundial. Já em 2006, durante os 11 meses em que Abe encabeçou pela primeira vez o governo japonês, deu importantes passos nesse sentido. Apesar das limitações impostas pela atual Constituição, Tóquio tem o sexto maior orçamento militar do mundo - 45 bilhões de euros em 2012, embora para 2013 se preveja uma redução de 1,8%.
Policiais jogam bombas de gás lacrimogênio contra manifestantes em Shenzhen, na China, neste domingo. A China vive o segundo dia de protestos motivados pelo anúncio do Japão, na semana passada, de que havia comprado as ilhas Senkaku - território alvo de disputa com a China - de um proprietário privado
As ilhas Senkaku/Diaoyu, que Washington quis manter sob seu controle até devolvê-las ao Japão junto com o arquipélago de Okinawa em 1971, estão protegidas pelo tratado de defesa mútua entre EUA e Japão. Por isso essa disputa também amarga as relações entre Pequim e Washington.
"A China deve sentir a contenção dos EUA para que não continue sua expansão. É preciso exercer pressão e não só militar, mas também econômica", indicam fontes diplomáticas japonesas.
Para a China, a nova estratégia de segurança nacional do presidente Barack Obama, que dá prioridade à região da Ásia-Pacífico, não tem outra intenção além de "cercá-la e impedir sua ascensão". Daí o mal-estar existente pela decisão americana de estreitar as relações estratégicas com o Japão e a Coreia do Sul, países nos quais tem estacionadas tropas, além de outros vizinhos da China, como Filipinas, Vietnã, Índia e Mianmar (antiga Birmânia).
A China não aceita as críticas de Washington ao forte aumento anual de seu orçamento militar e retruca que chega a apenas 1,8% de seu PIB, enquanto o dos EUA, com US$ 662 bilhões (R$ 1,3 bilhão), supera 2% do PIB americano. Além disso, a decisão de potencializar a espionagem, os robôs de combate, as operações especiais e a guerra cibernética é vista por boa parte do PCCh como "a prova evidente de que Washington desatou uma nova guerra fria na Ásia porque não está disposta a permitir a ascensão pacífica da China", segundo diferentes analistas.
Washington, por sua vez, está muito incomodada com Pequim porque não freia as ameaças nucleares de seu parceiro norte-coreano, cujo regime considera "muito pouco confiável". A colocação em órbita de um satélite na semana passada é vista como um novo teste de míssil intercontinental e viola as diretrizes da ONU, mas não é possível impor sanções a Pyongyang, porque Pequim o impede ao considerar que, se isolar ainda mais esse regime, poderá torná-lo mais perigoso e beligerante.
A vitória eleitoral da conservadora Park Geun-hye também tem um papel importante na região. A Coreia do Sul é um destacado parceiro militar de Washington, mas a disputa pelas ilhas Dokdo (em coreano) / Takeshima (em japonês) envenenou nos últimos meses as relações com o Japão. Além disso, durante seu primeiro mandato como chefe de governo Abe rejeitou que o exército imperial tenha utilizado "escravas sexuais" coreanas durante as guerras de expansão pela Ásia na primeira metade do século 20, o que provocou protestos em Seul. Abe se viu obrigado a pedir perdão para não romper as relações com seu vizinho.
Seul está quase mais preocupada com o aumento do nacionalismo japonês do que com o do chinês. Mas o que seus vizinhos aguardam com interesse é ver que atitude tomará diante de Pyongyang. Boa parte dos sul-coreanos apoia uma melhora das relações entre os dois países, o que favoreceria economicamente a ambos.
Tradução: Luiz Roberto Mendes Gonçalves

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