domingo, 30 de dezembro de 2012

Austeridade vai provocar distúrbios sociais, advertem municípios ingleses


Austeridade vai provocar distúrbios sociais, advertem municípios ingleses

Em uma carta pública ao governo, três dos maiores municípios do norte da Inglaterra – Liverpool, Newscatle e Sheffield – advertiram que o corte adicional de 2% que o governo anunciou em dezembro e que se soma aos 28% de cortes orçamentários em curso está devolvendo o país a um mundo “dickensiano”. Os novos cortes vão provocar distúrbios sociais e aumentar a delinquência, diz a carta.

Londres - Com a economia à beira da terceira recessão em três anos, o primeiro ministro David Cameron chamou os britânicos em sua mensagem de fim de ano a manter o otimismo e insistiu que a austeridade é o “caminho correto”. Uma pesquisa publicada pouco antes de suas palavras mostra que 43% da população pensa que a situação vai piorar em 2013; só 20% acham que as coisas vão melhorar. Uma mensagem similar foi a dos municípios de Liverpool, Newcastle e Sheffield que advertiram o governo em uma carta pública de que os novos cortes vão provocar distúrbios sociais e a crescente delinquência no norte do país, a região esquecida do Reino Unido.

O primeiro ministro britânico reconheceu que 2012 havia sido um ano “duro”, mas assinalou que o programa de austeridade (140 bilhões de dólares de cortes entre 2010 e 2015) era o único modo de lidar com o desafio global que representam economias emergentes como China, Índia e Indonésia. “Em um mundo tão competitivo, não poderemos triunfar se estivermos sufocados pela dívida”, disse Cameron. O primeiro ministro assegurou que essa dívida foi reduzida em cerca de 25 bilhões de dólares e que quase 500 mil pessoas a mais, em relação ao início do ano, estão empregadas. “Podemos olhar o futuro com otimismo e realismo. Realismo porque sabemos que não podemos solucionar problemas de décadas da noite para o dia. Otimismo porque estamos fazendo um progresso tangível”, disse Cameron.

Convencer os britânicos a adotar esse humor exigirá algo mais que uma boa onda “new age”. O consumo doméstico caiu fortemente nos dois anos e meio do governo da coalizão conservadora-liberal democrata pelo medo gerado pelo seu programa de austeridade e pela enorme dívida pessoal dos britânicos (calculada em quase dois bilhões de dólares). 

Neste sentido, a pesquisa publicada pelo jornal The Observer deixa claro que os britânicos têm hoje muito mais “realismo” do que “otimismo”, algo que não vai ajudar a tirar a economia do pântano pela via do consumo. Com uma contração econômica de 0,1% em 2012, o pessimismo é mais marcado entre os maiores de 55 anos do que entre os jovens, mas o panorama geral da pesquisa é sombrio.

A percepção é mais sombria no norte do que no sul do país. Em uma carta pública ao governo, três dos maiores municípios do norte da Inglaterra – Liverpool, Newscatle e Sheffield – advertiram que o corte adicional de 2% que o governo anunciou em dezembro e que se soma aos 28% de cortes orçamentários em curso está devolvendo o país a um mundo “dickensiano”. 

“A delinquência está aumentando, as tensões sociais e comunitárias, os problemas nas ruas vão terminar em uma dissolução social se não mudarmos de rumo”, assinalaram os diretores dos três conselhos municipais (na Inglaterra não há governo provincial). O norte, mais pobre e dependente do emprego governamental, foi duramente golpeado pelo programa de cortes.

Em meio a tantas atribulações, a coalizão no governo teve uma boa notícia. Ainda que as pesquisas sigam mostrando o trabalhismo com 10 pontos de vantagem nas intenções de voto, em um aspecto chave – a economia – os britânicos seguem confiando mais nos conservadores. Esse passe de mágica deve-se a que, nas eleições de 2010, os conservadores conseguiram convencer a maioria de que a crise econômica vivida pelo Reino Unido tinha como causa a irresponsabilidade fiscal dos trabalhistas e não o estouro financeiro e o massivo resgate governamental dos bancos. 

Esta percepção contou com o incalculável auxílio de alguns meios de comunicação dominados por uma visão neoliberal. Dada a recessão em que a economia mergulhou este ano e o fato de que as metas de equilíbrio fiscal projetadas para 2015 foram estendidas até 2018 porque a austeridade está piorando as coisas, o mistério é quanto tempo mais vai durar a magia.

Tradução: Katarina Peixoto

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