quinta-feira, 29 de novembro de 2012

Gideon Levy: em 29 de novembro Israel deveria votar por dois estados


Gideon Levy: em 29 de novembro Israel deveria votar por dois estados

Quando Israel diz não, o que isso significa? Que o papo dos dois estados é uma grande fraude; que o país simplesmente não quer a paz; que o mundo pode pular num lago; que os palestinos estão proibidos de lutar por sua liberdade, seja com armas ou com diplomacia; não ao Hamas e não a Abbas, da Autoridade Nacional Palestina. Não e não. Milhares de nãos de Jerusalém.

Tel Aviv - O escritor Amos Oz lembra deste dia, há 65 anos, em sua novela “Um conto de amor e trevas”: “No sábado pela manhã, eles disseram que a Assembleia Geral da ONU iria se reunir num local chamado Lake Success e lá determinariam nosso destino. ‘Quem é pela vida e quem é pela destruição’, disse o Senhor Abramski.

Abramski estava certo. Se ele estivesse vivo hoje, teria coisas similares para dizer a respeito do que acontecerá na noite desta quinta-feira na Assembleia Geral da ONU. Quem é pela vida e quem é pela destruição. Se Israel fosse um país sábio e razoável, teria se juntado à família das nações nesta tarde, sem falar na Micronésia, e votar orgulhosamente pela conclusão do voto anterior, em 29 de novembro: dois estados para dois povos. E se houvesse um espaço real para a paz em Israel, seus membros iriam voando em massa para o ato que está sendo preparado na frente do Hall da Independência, em TelAviv, onde este estado de Israel foi declarado.

Mas Israel, como de hábito, diz não. Primeiro, fazendo ameaças infantis, com desplante sem precedente, bullying e condescendência: nós vamos punir a Autoridade Nacional Palestina; vamos atingi-la no seu bolso; construiremos 3000 apartamentos nos assentamentos. E, agora, com uma voz mais mansa, estamos “baixando a bola”. E não é ainda não.

Quando Israel diz não, o que isso significa? Que o papo dos dois estados é uma grande fraude; que o país simplesmente não quer a paz; que o mundo pode pular num lago; que os palestinos estão proibidos de lutar por sua liberdade, seja com armas ou com diplomacia; não ao Hamas e não a Abbas, da Autoridade Nacional Palestina. Não e não. Milhares de nãos de Jerusalém.

Israel dirá ‘não’, hoje à noite, não apenas que os palestinos, mas para o mundo inteiro, exceto a seu patrão, os EUA, que aparentemente vai humilhar-se mais uma vez e levantar ainda mais ódio por votar automaticamente com Israel. A maioria dos israelenses não vai sequer se perguntar como chegamos ao ponto em que o mundo inteiro está contra nós: se talvez Israel tenha alguma responsabilidade nisso, de modo que votar contra a proposta da ANP só aumentará a rejeição.

“A maioria automática”, como Israel descaradamente chama a maioria sã nas Nações Unidas, votará pelo reconhecimento da Palestina como estado observador. Porque isso é o passo correto e necessário a ser dado; o jogo de palavras da propaganda israelense não vai funcionar. “Um passo unilateral”, chama Israel, com medo, enquanto constrói mais e mais assentamentos, num movimento que não é outra coisa que unilateral. “Uma brecha nos Acordos de Oslo”, acusa Israel, embora o país nunca tenha cumprido a sua parte no que respeita a “terceira parte” do acordo, que consiste na transferência da maior parte do controle da Cisjordânia para os palestinos, coisa que deveria ter sido feita há 15 anos.

Um Israel que se opõe à resolução da ONU é um Israel que quer o fortalecimento do Hamas e o retorno do terror. Não há outra maneira de explicar sua intransigência. Mas de todas as suas motivações insanas e sem fundamento para se opor, uma sobressai: o perigo de que, após a sua mudança de status na ONU, os palestinos supostamente apelarão ao Tribunal Penal Internacional em Haia, com respeito ao crime de guerra de remoção de uma população do estado ocupado para territórios ocupados.

De que exatamente tem medo Israel? Afinal de contas, o juiz aposentado Edmond Levy ajeitará tudo. De fato, ele já o fez: o comitê que ele lidera já determinou que não há ocupação alguma e que os assentamentos são completamente kosher. E assim, o que há a temer? Poderia ser o fato de que, a despeito do que o informe de Levy diz, há algo com que se preocupar? Afinal de contas, a Corte Internacional de Justiça combate os crimes de guerra e é respeitada por todo o mundo. Pelo contrário, vamos deixar Israel enviar o juiz Levy para essa corte para apresentar os argumentos justificados e persuasivos de Israel.

O Senhor Abramski está morto há muito tempo. Assim como a Senhora Tosia Krochmal, a vizinha do jovem Amos na Rua Amos no bairro de Jerusalém em que Kerem Avraham, 65 anos atrás, trouxe o fio da extensão de sua máquina de costura, no hospital em que estava o seu marido, para a casa de Lemberg, onde podiam trazer seu pesado rádio preto para a varanda, para escutar “as vozes do Lake Success”. Hoje à noite, ninguém estará escutando o rádio. Israel continuará a enterrar a sua cabeça na areia, para desconectar-se da realidade, para ignorar o mundo, ignorar a justiça e proclamar: não.

Tradução: Katarina Peixoto

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