sexta-feira, 23 de março de 2012

ESCOLA FAMÍLIA JÁ EXPORTA EDUCAÇÃO PARA TODO O BRASIL.


A GAZETA 1991

O Espírito Santo possui um produto de exportação que não aparece em nenhuma estatística do Governo. Este produto, em função de sua qualidade e valor, nunca é ofertado aos potenciais compradores como uma mercadoria ou máquina que sai de uma linha de montagem.

Trata-se da Escola Família Agrícola (EFA), que aqui chegou em forma de uma boa idéia no ano de 1965 e que já em 1969 passou a ser uma realidade concreta, com a abertura de escolas de primeiro grau em Alfredo Chaves, Anchieta e Rio Novo do Sul.

A EFA é um sistema de ensino rural que prepara o jovem para vida, como costuma dizer o padre Humberto Pietrogrande, jesuíta italiano que implantou o sistema aqui no Espírito Santo. Para dar sustentação ao novo esquema educacional foi criado o Movimento de Educação Promocional do Espírito Santo (MEPES), que também passou a se envolver no setor de saúde, com um hospital em Anchieta e vários mini-postos de saúde, bem como creches e o Centro de Formação de monitores localizado em Píuma. Este Centro é que dá e renova as energias do movimento, é como se fosse a sua alma, formando monitores, dando cursos de reciclagem e assessoria  às comunidades.

Alternância é a palavra e a forma de agir da EFA. É dentro do esquema de alternar a vida do aluno na escola e na sua casa que funciona a EFA. No primeiro grau o aluno passa uma semana em casa e outra na escola, já no segundo grau a alternância se da a cada duas semanas.

Ao alternar a escola e a sua casa o jovem passa a ser o elo entre a sua realidade e a escola, por meio de uma série de instrumentos que, ao invés de desligá-lo da família, o torna mais íntimo e cooperativo. A origem da EFA é a França, há 53 anos. Há 23 anos chegou ao Espírito Santo e, segundo o professor Sérgio Zanberlam, que trabalha no Centro de Formação, ”a história da EFA no Brasil é intensamente vivida e pouco escrita. Ela surgiu numa época de escuridão, período em que até a palavra conscientização era proibida”.

Foi dentro das dificuldades que as EFAs  iniciaram a caminhada que, segundo Zanberlam, está divida em três fases:
1-    A primeira está ligada diretamente à implantação do Mepes e às EFAs que nasceram lentamente e expandiram-se para outras regiões, indo de 1965, quando a semente foi lançada, até a sua formação em 1968.
2-    A segunda fase foi a consolidação no Espírito Santo, entre 1973-1983, quando iniciou a caminhada para a Bahia. Esta foi uma fase de muitas experiências em nível pedagógico e didático.
3-    A terceira fase é o início de uma ampla expansão para vários Estados e a diversificação na forma de conduzir a instituição, desde as que dependem diretamente do poder público local até a associação de produtores rurais.
Em 1971 entra em funcionamento a EFA de Campinho de Iconha e a primeira escola feminina de Iconha;
 Em 1972, Km-41 e Jaguaré (ambas em São Mateus) e São Gabriel da Palha;
Em 1976, Anchieta-Olivania, 2º grau técnico em agropecuária;
Em 1978, Rio Bannal;
Em 1985, Pinheiros;
Em 1986, Boa Esperança,  2º grau técnico em agropecuária;
Em 1988, Montanha e Nova Venécia;
Em 1991, Jaguaré passa para 2º grau técnico em agropecuária, encerra o 1º grau;
Em 1992, Montanha, 2º grau técnico em agropecuária.

Zanberlam observa ainda que usando a metodologia da alternância e com o apoio do Mepes, ''em 1990 surgem em Jaguaré as escolas comunitárias em São João Bosco e Giral, dependentes administrativamente da Prefeitura, fruto do trabalho de base, ajudado pela EFA e pela organização das comunidades rurais’’.

Cita ainda que em Santa Maria do Jetibá foi implantada uma EFA em 1990, após trabalho comunitário da Igreja Luterana. Neste ano, em Domingos Martins, também com a presença dos luteranos, surge mais uma EFA e também em Barra de São Francisco,
A PORTA
O Centro de Formação é o local onde os monitores (denominação dada ao que na escola tradicional se chama de professor) passam por treinamento de um ano e reciclagens periódicas antes de chegarem a EFA.

Zanberlan explica que ‘’é importante dizer que boa parte das EFAs que surgiram nas mais variadas regiões brasileiras teve colaboração estreita do Centro de Formação, um apoio direto com a formação de monitores e assessoria. Indiretamente colaborou trocando material pedagógico e respondendo a pedidos de informações, em vista de estreitar laços entre experiências similares e estimular uma maior solidariedade entre quem luta por uma sociedade mais fraterna.”

UNIVERSO

Uma caracterização das EFASs assenta sobre três pontos:

O AMBIENE FÍSICO - a maioria das EFAs funcionam em prédios próprios e possui um pedaço de terra, que acompanha o tamanho médio da propriedade rural da região, de 5 a 30 hectares, que serve para a produção de alimentos para os alunos. As construções na maioria dos casos são feitas com mão-de-obra das comunidades envolvidas (ou em parte da municipalidade). As comunidades rurais arrecadam dinheiro de várias formas: bingos, rifas, doações de material, animais e produtos agrícolas. Outra parte dos recursos para construção e reformas (principalmente nas regiões mais carentes) vem do exterior; via paróquia, diocese, instituições que atuam e assessoram movimentos populares ou por meio de entidades mantenedoras das EFAs ou a elas afiliadas. São construções que respeitam a arquitetura local.

O CORPO DOCENTE - normalmente os monitores, donas de casa e outros agentes educativos que atuam nas EFAs recebem seus vencimentos das instituições mantenedoras. Nos últimos anos, em algumas EFAs, o pagamento vem sendo feito por prefeituras ou pelo Estado.

OS ALUNOS - as turmas em geral são heterogêneas, na idade e no número. No início esta heterogeneidade era menor, porque as tentavam atender aos jovens adultos, diminuindo este contingente. A idade foi caindo e hoje ela varia de 11 a 17 anos. O número varia de 80 a 120 alunos. Tem-se verificado o aumento progressivo de filhos de meeiros e diaristas, mais ainda com a predominância dos pequenos proprietários. Esse fato acompanha as mudanças que a estrutura fundiária vem sofrendo em todo País, a concentração da terra é uma constante.

A PONTE

A EFA não é mais uma experiência, é um fato concreto, porque possui mais de 1.500 alunos e um número muitas vezes superior de ex-alunos que continuam vivendo e produzindo no campo.

O somatório do trabalho de muita gente fez com que o Espírito Santo exportasse a idéia para 12 Estados a idéia concreta e efetiva de uma nova escola. Uma via de duas mãos, pavimentada pela solidariedade e pela fraternidade.

A EFA não é dona do saber, mas uma ordenadora de informações, por isto respeita o produtor rural e a sua família, formando uma parceria na dor e na alegria.

A exportação da idéia concreta da EFA antes de ser concretizada, passou por um longo processo de entendimento e de conhecimento. Muitos produtores de outros Estados vieram conhecer o funcionamento das EFAs do Espírito Santo. Dezenas e dezenas vieram e estudaram no Espírito Santo, do primeiro e segundo graus, passando depois pelo Centro de Formação de Monitores. Depois seguiram viagem para plantar e colher frutos de novas EFAs nos seus Estados.

A contribuição do Espírito Santo para estancar o êxodo rural é muito grande. O êxodo rural que representa a marginalização das pessoas na periferia das cidades, tem a sua origem no descaso em relação a educação rural e tudo mais que diz respeito à família rural brasileira.

O produto de exportação capixaba não está na estatística do Governo, mas certamente é um marco em milhares de vidas que hoje continuam no campo vivendo com dignidade.

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